Esquema de Eratóstenes para cálculo do meridiano
Tomando altura de um astro
Latitude
Latitude
A ideia da esfericidade da Terra não foi muito difícil de aceitar. A projecção das sombras da Terra na Lua durante os eclipses parciais e a forma da Lua e do Sol, eram os sinais com que a Natureza argumentava contra aqueles mundos planos cheios de precipícios para os infernos.
Os gregos já aceitavam a esféricidade da Terra e o geógrafo Eratóstenes, que dirigia então a célebre biblioteca de Alexandria, foi o primeiro a calcular o perímetro do nosso planeta e com um erro bem inferior a Cristóvão Colombo 2.000 anos antes deste. A partir da sombra de um obelisco em Alexandria calculou que, ao meio-dia do dia do solstício de Verão, o Sol distava do zénite 1/50 da circunferência. Sabia também que em Siena no Alto-Egipto (hoje em dia Assuão), e naquele dia, o sol não projectava qualquer sombra nos fundos dos poços ao meio-dia.
Como as duas cidades estavam aproximadamente no mesmo meridiano, concluiu assim que o comprimento deste seria 50 vezes a distância entre elas, distância esta já conhecida. Com os meios técnicos de então a precisão foi espantosa. Um erro apenas de 24 em 40.000 Km!
Foi talvez a primeira noção de latitude, ainda que não angular. Hiparco, um matemático grego e um grande astrónomo, a quem se atribui a criação da Trigonometria, passou a medir a latitude de 0 a 90 graus a partir do Equador e especificou lugares na terra usando coordenadas do tipo latitude / longitude.
Atribui-se também a Hiparco a criação do astrolábio, com o qual se mediam alturas, instrumento que os portugueses simplificaram e adaptaram para o uso náutico. Ao longo dos tempos outros instrumentos náuticos para tomar alturas foram aparecendo, como o quadrante, a balestilha e finalmente o sextante, cuja precisão de leitura foi sendo melhorada até ao segundo de arco.
Não se pode propriamente falar do problema de latitude à semelhança do da longitude, já que o método de determiná-la era conhecido desde a antiguidade e não oferecia grandes problemas.
Quando não se avistava terra, as navegações oceânicas obrigavam ao conhecimento da posição, e como não havia pontos de referência, foram os astros a servirem esse propósito. O primeiro terá sido a estrela Polar, pela qual os portugueses no séc.XV tomavam a altura quando saíam e comparavam dias depois transformando a diferença da medida do arco em léguas navegadas. No início um grau equivalia a 16 léguas e 2/3 acertando-se no final do séc.XV para 17,5 léguas por grau.
Este método obrigava a que a tomada da altura fosse feita num determinado momento. O nocturlábio ou roda polar foi o instrumento usado para se saber as horas e também fazer as necessárias correcções na leitura, já que no séc.XV a estrela Polar não estava directamente sobre o pólo e fazia um raio de 3,5º com este. Devido ao fenómeno de precessão dos equinócios, este astro encontrava-se num movimento de aproximação do pólo e um século depois o raio era já bem inferior a 3º. As tabelas tinham de ser sucessivamente corrigidas ao longo dos tempos.
Este tipo de navegação era conhecido por Regimento do Norte e foi um grande avanço na navegação astronómica.
À medida que a navegação se aproximava do equador a estrela polar ia desaparecendo sendo a alternativa encontrar outra estrela com propriedades semelhantes. No hemisfério Austral uma estrela, Crucis ou Pé do Cruzeiro, foi usada para o cálculo da latitude, mas a distância daquela relativamente ao pólo não terá permitido cálculos muito rigorosos. Chegou-se também a fazer um regimento daquela estrela, mas o cálculo a partir daquela não era muito do agrado da maioria dos pilotos portugueses.
O uso da meridiana, tomada da altura do Sol quando este passa no meridiano do observador, foi o método mais apreciado e fácil qualquer que fosse o hemisfério. As regras eram simples e já havia tabelas com a declinação para todos os dias do ano. Este método era conhecido pelo Regimento do Sol.
As cartas náuticas, até então pouco ou nada precisas, passam a partir de agora a ter um maior rigor graças a uma latitude observada.
A latitude é o arco do meridiano que passa no lugar desde o equador até ao paralelo do lugar. Conta-se de 0º a 90º a partir do Equador e é Norte ou Sul conforme o hemisfério terrestre onde se encontra o lugar.
Nos cálculos a latitude toma valor positivo a Norte e negativo a Sul. Para obtermos a latitude de um lugar temos de tomar a altura do astro (normalmente o Sol ao meio-dia solar, também chamada de meridiana) e em conjunto com as tabelas náuticas, onde obtemos a declinação do astro naquele dia, fazemos os cálculos necessários.
Um meridiano é um círculo máximo que passa por ambos os pólos. Os paralelos, que devem o seu nome ao facto de serem círculos paralelos ao Equador, marcam as latitudes.
Anónimo - João Baptista Lavanha e Luís Teixeira, 1597 e 1612
Longitude
O primeiro a propor o uso de duas coordenadas para definir um lugar no globo foi Hiparco na Antiguidade: a latitude, um lugar num meridiano (círculo máximo que passa pelos pólos), e a longitude, um lugar num paralelo (círculo paralelo ao Equador). O cálculo da latitude era relativamente fácil e conhecido e era obtido com um astrolábio. Por sua vez a longitude oferecia mais problemas e nunca foi correctamente calculada até ao séc.XVIII, mesmo que teóricamente se soubesse como fazê-lo. A ciência é que ainda não tinha produzido instrumentos suficientemente precisos e a matemática ainda não tinha podido fornecer tabelas rigorosas.
Em termos de orientação em terra não havia grandes problemas já que os pontos de referência se mantinham fixos. No mar, onde não existem quaisquer referências a não ser os astros, e estes ainda por cima móveis, é que se punham dificuldades na orientação.
Quando no séc.XV os portugueses se lançaram pelo Atlântico, deu-se início a uma nova era nas viagens marítimas que obrigaram a alterar o tipo de navegação até então efectuado. Passou-se de uma navegação típicamente costeira para uma navegação puramente oceânica. No Mediterrâneo, apesar de algumas viagens serem feitas sem a costa à vista, a navegação era feita num espaço relativamente fechado e com muitas ilhas com base em cartas de rumos, onde os astros serviam apenas como companhia aos pilotos, ou para estes se guiarem nos rumos.
A verdadeira navegação astronómica começa sim com a exploração dos oceanos e a leitura nos astros das posições dos navios. Não foram só os portugueses os percursores deste tipo de navegação, que continua nos nossos dias, já que pela mesma altura os chineses exploravam com métodos similares o mar do Japão e a costa chinesa até Mombaça, na costa oriental africana pela mão de Zheng He.
Para uma obtenção de uma latitude mais rigorosa e menos complicada no mar, houve que aperfeiçoar e adaptar alguns métodos e instrumentos, já mais ou menos conhecidos. A procura da longitude, no entanto, foi uma aventura que durou cerca de trezentos anos com inúmeras tentativas de solução, revelando uma imaginação muito fértil e variada nas soluções apresentadas.
Na época o único método usado para a obtenção da longitude era a estima, o que por vezes originava erros por demais grosseiros. Graças à sua experiencia alguns pilotos obtinham resultados satisfatórios mas sempre sujeitos a dúvidas. A estima era resultante do rumo que o navio levava, da velocidade, o que era feita literalmente "a olho" e do tempo percorrido com o uso de ampulhetas. Contava portanto, e muito, a experiência dos pilotos.
Como se vê nunca se poderiam obter resultados credíveis e o primeiro caso concreto passou-se logo em 1494 quando os dois reis ibéricos assinaram o Tratado de Tordesilhas que dividia o globo em duas zonas de influência. Uma castelhana e outra portuguesa, delimitadas por um meridiano que passava a 370 léguas a oeste de Cabo Verde. Esse meridiano "movia-se" consoante os interesses e resultou mais tarde em alguns problemas quanto à posse das Molucas e parte do Brasil.
A cartografia por sua vez, se tinha melhorado, era apenas quanto à latitude, pois a longitude era grosseiramente obtida.
Este problema tornou-se assunto de estado para vários países envolvidos na exploração dos mares e vários monarcas europeus ofereceram recompensas pela descoberta de um método simples e eficaz para obter a longitude no mar.
Em 1598 Filipe III de Espanha ofereceu 10.000 ducados como prémio. Entre os que concorreram conta-se Galileu que propunha em 1610 a medição do tempo a partir das observações das luas de Júpiter. A correspondência de alguns anos com a corte espanhola não convenceram o rei. Os holandeses também instituem um prémio em 1636 e levam Galileu mais a sério, só que entretanto este é impedido de ser contactado pela Inquisição e ao fim de alguns anos acaba por morrer.
A solução passava de facto pela conservação do tempo do meridiano referêncial durante a viagem, mas todos reconheciam que com os tipos de relógios então existentes não era possível a precisão necessária. Em 1514 Johann Werner apresenta o método das distâncias lunares e apesar de teóricamente correcto a técnica de então era ainda insuficiente. Pela mesma altura João de Lisboa imagina um processo de determinar a longitude pela variação da declinação magnética, partindo do princípio de que existia uma proporcionalidade linear entre elas. D.João de Castro provou em 1538 a impossibilidade desta teoria.
Variados e elaborados métodos para a determinação da longitude foram sendo apresentados ao longo dos anos. Apoiavam-se na observação de eclipses solares, lunares, dos satélites de Jupiter, da ocultação de astros pela Lua, de relógios e até explosão de bombas! Esta última solução, de M.Whiston e Ditton, propunha a instalação de morteiros ao longo da costa e ilhas que disparariam a horas certas e regulares. Assim os navegadores saberiam as horas em terra que comparadas com as do navio daria a diferença de longitudes entre dois lugares!!
Em França era criada em 1666 a Academie Royale des Sciences com o objectivo de reunir os melhores cientistas da época e, claro, empenhada na resolução práctica do problema da longitude. Um prémio instituido por Luis XIV de 100.000 florins era o aliciante para essa descoberta. Os franceses acreditavam num relógio para medir a diferença de tempo entre o meridiano do lugar e um referêncial, e para isso criaram em 1667 o Meridiano de Paris, que passava no Observatório de Faubourg em St.Jacques. Porém o uso do pêndulo nos relógios de bordo não dava a precisão para um cálculo no mar.
Anteriormente a ampulheta também foi o obstáculo no cálculo, pois a sua precisão não dava qualquer confiança. Só para ter uma noção de erro lembramos que um erro de 4 segundos origina uma diferença de 1 milha náutica!
Em 1707, em resultado de uma catástrofe em que uma esquadra inglesa e o seu conceituado almirante se perderam nas rochas das ilhas Scilly, o parlamento inglês criou em 1714 a Board of Longitude com o fim específico de resolver o problema. Perder uma esquadra no apogeu da navegação inglesa por acidente e não por acção inimiga foi humilhante. Por sua vez um prémio de 20.000 libras era a recompensa oferecida.
Não faltaram candidatos, entre os quais se incluiam Newton que propunha o método lunar, e em 1735 John Harrison apresenta o primeiro protótipo de um cronómetro marítimo acabando mais tarde por ganhar o prémio.
Apesar de tudo e devido à falta de confiança no instrumento e ao seu preço, somente quando o sinal horário começou a ser emitido por rádio é que o uso do cronómetro se generalizou. Até lá usou-se o método lunar para a obtenção do tempo e cada país usava o seu meridiano de referência para a obtenção do lugar. Portugal o meridiano de Lisboa, que passava pelo Real Observatório da Marinha, Espanha o de Cádiz, França o de Paris e os ingleses o de Greenwich desde 1767, data em que Nevil Maskelyne começou a editar tabelas náuticas. Isto obrigava a que cada país fizesse tabelas diferentes em função do meridiano escolhido.
Observatório Astronómico de Lisboa | Observatório Astronómico de Paris | Observatório de Greenwich
Em 1884, na Conferência Internacional do Meridiano em Washington, vinte e seis países concordaram em usar o meridiano que passa por Greenwich como referêncial. Apenas os franceses não o reconheceram e continuaram a usar o de Paris até 1911, ano em que decidiram, ainda que com algumas reservas, usar finalmente o de Greenwich.
Longitude
Os círculos que marcam a longitude são os meridianos, círculos máximos e perpendiculares ao Equador que passam pelos pólos.
Paralelos são círculos paralelos ao Equador, que marcam as latitudes. A longitude é o arco do paralelo qua passa no lugar desde o meridiano de referência até ao meridiano do lugar. Conta-se de 0º a 180º a partir do meridiano de Greenwich e é Oeste ou Este conforme o lugar se encontre respectivamente à esquerda ou à direita deste meridiano.
Nos cálculos a longitude toma valor positivo a Este e negativo a Oeste.
Para obtermos a longitude de um lugar temos usar um cronómetro com a hora do meridiano de referência. Tomando o instante em que o Sol passa no meridiano de lugar (meio-dia solar), calcula-se a diferença para a mesma passagem que ocorreu em Greenwich. Converte-se a diferença temporal em arco e obtém-se a longitude:
Ex: Segundo as tabelas náuticas deu-se, num determinado dia, a passagem da meridiana em Greenwich às 12:03:42 (é necessário consultar a equação do tempo no almanaque). Tomou-se a hora da meridiana no lugar às 12:51:05
A seguinte fórmula dá-nos a longitude a partir da diferença das horas:
l = TU - h
onde TU é o Tempo Universal (hora de Greenwich), h a hora da passagem meridiana no local e l a longitude em tempo.
Assim a diferença é de -00:47:23. Para converter em graus basta lembrar que a 360º correspondem 24 horas (15 graus equivalem a uma hora, 15 minutos de arco a 1 minuto tempo e cada segundo tempo a 15 segundos de arco).
Assim temos que a nossa longitude é W 011º45'6'', Oeste porque a diferença é negativa.