Âncoras de Pedra (c. 2000 AC)
Nos primeiros tempos uma pedra amarrada a um cabo tinha a mesma função daquilo a que hoje denominamos por âncora. Apenas com embarcações pequenas e águas não muito agitadas é que este método ancestral tinha alguma eficácia. Mas à medida que os barcos tendiam a ser maiores e mais pesados, outros instrumentos de fundear foram imaginados. Os fenícios, gregos, romanos e chineses já usam âncoras de madeira com a mesma forma das de hoje. Os Vikings já tinham cepos de chumbo e na Idade Média eram vulgares hastes e braços de ferro com o cepo em madeira. Nos dias de hoje são normalmente uma peça em ferro, daí o nome corrente de ferro, com as mais variadas formas e feitios. O objectivo é manter o centro de gravidade o mais baixo possível de modo a enterrar as patas no fundo para proporcionar uma fixação segura.
Para manter a âncora numa posição ideal de modo a enterrar-se com pouca dificuldade, esta está ligada a uma corrente que, com o seu peso, tem por função deitar o mais possível a haste. Além disso proporciona um efeito de amortecedor perante a ondulação mantendo a âncora sem movimento por efeito daquela. O facto de ser o símbolo que normalmente se associa à marinha demonstra a antiguidade e importância de que é alvo ao longo dos tempos.
A - Anete B - Cepo C - Haste D - Braço E - Cruz F - Pata G - Unha |
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Manobra de fundear
Enquanto em terra qualquer problema que ponha em causa o andamento de, por exemplo, um automóvel no mar se isso, ou qualquer outra coisa semelhante acontecer, não podemos pura e simplesmente encostar a embarcação para "mais tarde" resolver a situação. Por vezes a única solução é mesmo fundear para podermos solucionar o problema ou mesmo pedir por socorro de modo a que não possamos, por exemplo, ir à deriva de encontro às rochas. O Ferro é usado não só para fundearmos para um descanso e uns banhos, mas também numa emergência o que obriga a que esteja sempre em boas condições e disponível.
Descrevemos seguidamente os passos necessários para fundear em segurança que deverão estar sempre na mente de cada um no momento da manobra. Só com a prática aperfeiçoamos a técnica que um dia nos poderá salvar.
- 1º estudar o local - Devemos conhecer ou pela prática ou por uma carta náutica o local onde pretendemos fundear, ou seja, o tipo de fundo, altura da sonda, condições atmosféricas e de mar, a previsão da maré e se existem outras embarcações já fundeadas. Convém ter sempre uma alternativa no caso da manobra falhar ou não resultar. Deve escolher fundos de areia ou lodo e não muito altos.
- 2º preparar o ferro - Um tripulante à proa com o ferro preparado para largar. Amarra sem "cocas" e convés limpo de modo que não haja impedimentos à saída. Talvez seja necessário acrescentar a bóia de arinque.
- 3º aproar ao mais forte - Quando se aproximar do local, aproado ao mais forte, vento ou corrente, retire motor e arreie a vela de proa - e a grande se aproar à corrente.
- 4º arrear o ferro - À ordem do comandante, quando o barco começar a andar à ré, deve descer (não atirar!) o ferro até tocar no fundo. Soltar devagar a amarra de maneira a facilitar, com o peso que o barco exerce, o unhar no fundo. Normalmente larga-se 3 a 5 vezes de amarra em altura do fundo em condições normais. De 5 a 7 vezes de amarra se houver previsão de "tempo" rijo.
- 5º verificar a posição Depois de amarrar o cabo num cunho é altura de verificar através de pontos de referência fixos na costa se o barco não descai. Não se esqueça de prever a eventual rotação se o vento ou maré virar.
No caso de fundear num rio é natural que seja a corrente o elemento predominante, e neste caso, se esta estiver sujeito a mudanças de sentido, dever-se-á fundear com duas âncoras. Lançando uma à proa e outra à popa de modo a que seja feita tracção apenas numa delas, consoante a corrente, para evitar a rotação da âncora.
Tipos de Âncoras mais usados
Cada embarcação deverá usar o ferro apropriado e com as características indicadas para o tipo de casco e qualidade de fundo onde irá fundear. Uma escolha errada poderá pôr em risco o barco e a própria tripulação. A âncora deverá estar ligada a uma corrente, a amarra, de comprimento nunca inferior ao da embarcação, e aquela a um cabo próprio com comprimento suficiente para os fundos onde normalmente se pensa ir fundear. De preferência deve-se usar apenas corrente mas o seu peso e preço faz com que se junte corrente com cabo. O cabo, em vez da corrente, também facilita o corte deste no desembaraço da âncora quando esta fica presa e irremediavelmente perdida. O comprimento total deverá obedecer basicamente à seguinte regra:
- em águas calmas de 3 a 5 vezes a altura da maré (na preia mar!)
- com tempo rijo de 5 a 7 vezes a altura da maré
Um comprimento total de 50 metros parece ser o mínimo razoável. Um segundo ferro, outro tanto de corrente, e cabo pronto a ser ligado ao primário não são demais. Não será com certeza o primeiro a ter de cortar a amarra por a âncora ter ficado presa e ser impossível a sua recuperação. É aqui que entra o cabo de arinque que é preso à cruz, ou olhal próprio, e permite na maioria das vezes desengatar a âncora, sobretudo, em fundos desconhecidos. Na outra extremidade deste cabo prender-se-á uma bóia que assinala a sua presença.
A corrente do segundo ferro tem outra utilidade. Em caso de previsão de relâmpagos deve-se prender à base do mastro, quando metálico, ou aos brandais, de modo a fazer uma ligação à terra e afastar a hipótese de acidentes com as descargas eléctricas. Para quem já viu e "ouviu" um relâmpago a cair próximo de um veleiro, acreditem que é remédio santo!
As tabelas de diversas âncoras mais comuns aqui apresentadas servem apenas como referência e os valores descritos assumem condições normais de mar e vento. Deve aconselhar-se quanto às características da âncora e amarra junto do vendedor.
Almirantado ou Ordinária
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O cepo com os extremos boleados e um deles recurvado em forma de cotovelo, é móvel, o que facilita o transporte e a arrumação. Dá para todos os fundos mas a sua forma são o grande contra-tempo nas embarcações de recreio. |
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Danforth |
Para fundos de areia. É normalmente usado como 2º ferro. Tabela para âncoras em aço.
Tabela para âncoras de alumínio.
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Britany |
Dos melhores ferros para fundos de areia. Parecido em termos de eficiência com o Danforth.
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CQR |
Dos ferros mais usados por unhar bem em qualquer fundo, seja areia, lodo ou mesmo rocha. Tem o inconveniente de ser relativamente pesado. É normalmente a âncora de primazia.
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Bruce |
Este tipo de âncora é concebido para condições duras desde que tenha corrente suficiente. Boa para fundos de areia e lodo.
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Fateixa |
Este ferro é normalmente usado por pescadores por unhar bem em fundos de rocha. Usam-se também em embarcações pequenas pelo facto de algumas poderem encolher os braços. |
Outras Âncoras
Ancorote - Do feitio de uma âncora vulgar, mas de menor tamanho e peso.
Capacete ou Cogumelo - Não tem cepo e em vez de braços tem uma calote esférica na extremidade da haste. É usada em amarrações fixas.
Flutuante - Ao contrário das outras não serve para fundear mas para diminuir o andamento de um barco que no mar esteja à mercê das vagas e do vento. Ao fazer resistência na água, este aparelho, seguro ao barco por um cabo suficientemente comprido, permite conservar uma embarcação aproada ao vento com mau tempo. Tem o formato de um grande papagaio de lona com a armação em cruz a cujas extremidades dos braços se ligam um estropo de quatro pernadas. Esse estropo deve ser o mais comprido possível para suavizar os esticões. Mantém-se na vertical graças a umas bóias presas nas extremidades horizontais e a um lastro num dos braços da cruz.
Gata - Como uma âncora de almirantado vulgar, mas só com um braço.
Martin - De haste muito reforçada e braços articulados que podem baixar ou levantar por estarem ligados a um eixo que atravessa a cruz. O cepo é muito curto, fixo no plano dos braços e tem os extremos revirados para o lado do anete.
Parafuso - Sem ser propriamente uma âncora, tem no prolongamento da haste um parafuso que enterra no fundo. É usada apenas em amarrações fixas.
Smith - Não tem cepo e as patas giram independentemente uma da outra, num eixo que passa na cruz. É a que normalmente se usa em navios de grande porte.
Trotman - Âncora com os braços móveis, como os de uma balança, e as patas de forma côncavas.
Alguns termos
Amarra - Ligação, que pode ser de corrente e ou cabo, entre a âncora e a embarcação.
A pé de galo - Quando além daquele ferro com que está fundeado, se larga outro de modo a tocar o fundo, pronto a unhar, se faltar aquele pelo qual está amarrado.
À roça - Ferro quando pronto a ser lançado para o fundo.
Encepar - Colocar o cepo perpendicular à haste fixando-o por meio da chaveta, normalmente numa âncora do tipo Almirantado.
Fuzis ou Elos - Anéis das correntes da amarra.
Ir à rola - Ir ao sabor do vento e do mar.
Ir à garra ou garrar - Arrastar sem que consiga unhar.
Lambareiro - gato (ou gancho) ligado a um cabo para suspender âncora pelas unhas.
Largar ferro - Soltar a âncora e deixá-la cair para o fundo ficando ligada ao barco pela amarra.
Suspender - Trazer acima a âncora que se largou.
Talingar - Acção de ligar a amarra ao ferro.
Unhar - É o ferro ficar preso ao fundo pela unha.